João
Paulo Freitas (4º Período) para a edição 56 do Jornal Lince (outubro de 2013).
Nascido na
pequena cidade de Bicas, interior de Minas Gerais, Marcelo Guilhermino Barreto,
45 anos — mais conhecido como Marcelo Barreto —, conheceu uma de suas maiores
paixões, o jornalismo. Com uma vasta experiência e um currículo invejável,
Barreto figura entre os maiores jornalistas esportivos do país. Passou os dois
últimos anos como correspondente internacional em Londres, pelo canal por
assinatura SPORTV. Atualmente ocupa a bancada do programa Sportv News, no qual
foi editor chefe. Confira abaixo o bate papo que tivemos com esse grande
profissional da comunicação.
Lince - Conte-nos um pouco sobre sua trajetória no jornalismo.
Barreto - Meu primeiro emprego foi na assessoria de imprensa da
Prefeitura Municipal de João Monlevade, logo depois que completei os créditos
no curso de comunicação da PUC-Minas, no início de 1990. Pouco depois, tive
minha primeira experiência em jornal, na sucursal do Hoje em Dia em Governador
Valadares. No ano seguinte, fiz prova de estágio para O Globo e me mudei de vez
para o Rio. Trabalhei por sete anos na editoria de esportes do jornal, pela
qual cobri dois Mundiais de Basquete e as Olimpíadas de Atlanta em 96. Em 98,
participei da equipe que fundou o LANCE!. Trabalhei no jornal, no site
LANCENET!, comandando a transformação em portal e a incorporação da Agência
Sportpress, e coordenei o lançamento da revista LANCE!A+. Durante esse período,
fiz um fellowship de jornalismo na Universidade de Michigan e na volta cursei o
MBA Executivo do Coppead-RJ. Depois, minha carreira transcorreu dentro das
Organizações Globo. Fui editor-chefe do Portal do Esporte, trabalhei na
editoria de esportes da TV Globo como produtor e repórter e, em 2003, fui para
o SporTV. Aqui, implantei o Núcleo de Produção (do qual fui chefe) e fui
apresentador e comentarista de vários programas: Redação SporTV, Tá na Área,
Troca de Passes, SporTV Repórter, Arena Olímpica, Momento Olímpico. Nos últimos
dois anos, fui correspondente do canal em Londres. Voltei ao Brasil no meio
deste ano e hoje apresento o SporTV News, jornal do qual fui editor-chefe antes
dessa experiência no exterior. Pelo SporTV, cobri duas Copas do Mundo, duas
Olimpíadas, uma Paralimpíada e três Copas das Confederações, entre outras
competições internacionais.
Lince - Atualmente, quais as maiores dificuldades que os jovens
jornalistas irão enfrentar para ingressar na área de comunicador esportivo?
Barreto - Pelo que ouço quando converso com estudantes de comunicação, um
dos principais problemas será a concorrência. Estou impressionado com o número
de jovens que ingressam nas faculdades de comunicação pensando especificamente
em trabalhar com o jornalismo esportivo. E não tenho certeza se nosso mercado
continuará em crescimento nos próximos anos. Existe todo um movimento de
mudança de hábitos de consumo que tem afetado áreas importantes do mercado,
principalmente os jornais. É claro que eventos ao vivo ainda têm um valor
diferente, o que pode preservar TVs e rádios enquanto não tiverem de disputar
os direitos com a internet. É possível que os jovens que hoje estudam para serem
jornalistas esportivos cheguem ao mercado num momento de grande mudança. Mas
eles são também, como consumidores de mídia, agentes dessa mudança, e têm tudo
para se adaptar rapidamente.
Lince - Como foi sua experiência como correspondente internacional
Sportv, em Londres, e quais os pontos positivos que trouxe para a comunicação
no Brasil?
Barreto - Para mim, foram dois anos inesquecíveis, de grande crescimento
profissional e pessoal. Mudar de país é uma decisão bastante complicada, que
mexe com a logística de toda a família. Tenho dois filhos, que tiveram de se
adaptar a um ambiente educacional totalmente diferente, e minha mulher, que
também é jornalista, precisou adaptar sua carreira à nova realidade. Voltamos
todos felizes e com grandes experiências na bagagem — e agora estamos passando
pelo processo de readaptação. No meu caso, foi uma importante reciclagem
profissional. Saí do estúdio e voltei para a rua. Cobri competições
importantes, entrevistei grandes atletas, viajei por toda a Europa e tive de me
virar em outros idiomas. Observei muita coisa na forma de se cobrir esporte lá
fora e acho que trouxe alguns bons exemplos para usar no Brasil.
Lince - Como você avalia o futuro do futebol brasileiro, tendo em vista
o crescimento econômico das equipes e, também, os eventos internacionais
prestes a serem realizados em nosso país, em termos de visibilidade?
OBS: Pode me
chamar de você nas perguntas.
Barreto - Tenho dúvidas sobre quanto tempo vai durar o crescimento
econômico das equipes. O que aconteceu nos últimos anos foi um reflexo do
crescimento da economia brasileira como um todo, e esse processo já está
sofrendo uma desaceleração. Os grandes times do futebol europeu não foram tão
abalados pela crise econômica no continente — que também já começa a mudar de
curso — e voltaram a fazer grandes contratações. Basta ver o desastre que foi
para o futebol brasileiro a última janela de transferências. O uso das arenas
da Copa pelos clubes pode ter um impacto positivo na arrecadação, mas é preciso
muito mais para competir com o dinheiro que vem de fora. Alguns avanços estão
sendo feitos na administração de dívidas, mas ainda é preciso melhorar o calendário,
resolver o problema das divisões de base, investir em estrutura.
Lince - Durante os protestos feitos no Brasil, você ainda residia na
capital inglesa. Como os europeus reagiram a todos esses acontecimentos? Você
acha que isso afetará na vinda de turistas estrangeiros, principalmente para a
Copa do Mundo 2014?
Barreto - Na época dos protestos, eu morava em Londres, mas estava em
Madri cobrindo a Copa das Confederações. A reação aos protestos, lá, foi de
perplexidade. Os espanhóis, que vivem num país em crise, com mais de um quarto
da população sem emprego formal, viam no Brasil um país em crescimento
econômico, e não imaginavam que os brasileiros tinham motivos para reclamar.
Mas como os próprios espanhóis se acostumaram a ver os protestos na Plaza del
Sol, em Madri, a repetição das imagens acabou gerando uma simpatia, uma
sensação de identificação. A imprensa esportiva espanhola, que errou a mão em
alguns comentários sobre a Copa das Confederações, foi bastante equilibrada
quando tratou da questão dos protestos.
Lince - O futebol sempre foi o carro chefe dos esportes no Brasil. O
que você acredita que deve ser feito para que modalidades como vôlei, basquete,
entre outros especializados, atinjam um nível de excelência tão forte quanto o
dos gramados?
Barreto - Não vejo chances de isso acontecer num futuro próximo, nem acho
que deva ser esse o foco de outros esportes. O futebol é dominante em muitos
países do mundo, não apenas no Brasil. Exerce esse domínio há muitos anos e
deve mantê-lo por muitos outros. O que os demais esportes precisam fazer é
encontrar seu espaço. Construir uma base sólida de torcedores, investir no
desenvolvimento de talentos, manter-se competitivo em nível internacional. Foi
a receita que o vôlei aprendeu há algum tempo, e que o basquete parece ter
esquecido.
Lince - Quem foi seu maior mestre na área profissional, e quais as
lições mais valiosas que ele te deixou?
Barreto - Seria injusto escolher um entre os muitos jornalistas que me
inspiraram e me ajudaram ao longo da minha carreira. Mas ainda pior seria fazer
uma lista e deixar alguém importante de fora. Então, para não deixar a pergunta
sem resposta, cito aqui a maravilhosa convivência que tive com Armando Nogueira
no Redação SporTV. Ele já não era mais um alto executivo da TV Globo, estava
chegando aos 80 anos exercendo sua maior paixão, falar de futebol. Mas trazia
com ele, claro, a experiência de quem tinha começado a cobrir Copas do Mundo em
1954. Era uma figura muito doce, um homem muito inteligente, um jornalista
brilhante. Faz muita falta a todos nós que convivemos com ele naquela época.
Lince - Avalie e faça um comparativo entre a imprensa europeia e a
brasileira.
Barreto - É muito difícil falar em imprensa europeia. A inglesa é muito
diferente da francesa, da italiana, da espanhola. Para ficar apenas no
jornalismo esportivo, os ingleses gostam mais de texto, nos jornais, e de
debates, nos programas de TV. Os franceses dão menos espaço ao futebol, dividem
mais a atenção com outros esportes. Espanhóis e italianos têm um jeitão mais
parecido com o brasileiro, mais apaixonado. Os jornais espanhóis se portaram
mal durante a Copa das Confederações, fazendo comentários tendenciosos para
defender sua seleção de acusações de mau comportamento fora de campo. No geral,
o que dá para dizer é que em termos de qualidade, de tecnologia, a imprensa
brasileira não deixa muito a dever a essas que citei. São características
diferentes, mas estamos num nível semelhante.
Lince - Para finalizar, deixe um recado para os estudantes de
comunicação do Centro Universitário Newton (Belo Horizonte), que pretendem
seguir seus passos na carreira.
Barreto - O que gosto de dizer a quem escolhe o jornalismo esportivo é
que nossa área não está isolada do resto do mundo. Para falar de esporte,
acabamos falando também de economia, de saúde, de direito, de política. Enfim,
ser uma Wikipédia ambulante sobre esporte pode ajudar, mas com cultura geral se
vai muito mais longe. Boa sorte a todos, nos encontramos nas coberturas!
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