A gente quer comida, diversão e arte, mas na região Noroeste fica
difícil, pois quase não há investimentos e quem mais sofre com isso são os
jovens
Rayza Kamke e Rodolpho Victor (4º e 2º períodos) para a edição 56 do Jornal Lince (outubro de 2013).
Entre
as diversas regiões que compõem o município de Belo Horizonte, a Noroeste, que
engloba os bairros do Caiçara, Pedro II, Aparecida, Adelaide, Ermelinda, Nova
Esperança e Santo André, entre outros, é a mais populosa e representa 11,2% dos
jovens na faixa etária de 15 a 29 anos, entre os 632 mil que fazem parte da
população da cidade, hoje de aproximadamente 2.375.444 habitantes. Apesar da
densidade populacional, trata-se de uma região de grandes desigualdades, em que
os jovens das comunidades carentes se veem ainda mais prejudicados pelos poucos
recursos que possuem para se incluírem nas pequenas opções.
A
região tem um número muito grande escolas e um parque (Parque do Caiçara), mas
quase nada em função do lazer e do esporte. Uma das poucas opções para os
jovens ainda é o Shopping Del Rey, onde nada é de graça. Na área cultural,
quase nenhum investimento. A região Noroeste é um espelho do que, a exceção da
região Centro Sul, acontece em todas as demais. A psicóloga Sylvia Flores
explica que o lazer bem executado, planejado e saudável é imprescindível para o
equilíbrio emocional. De acordo com ela, se não houver momentos de lazer ou
prazer, o ser humano acaba entrando em um processo de stress profundo, que pode
gerar doenças psicossomáticas, ou simplesmente psíquicas, como agressividade
exagerada ou impulsividade. “É necessário ter prazer para podermos ter um
equilíbrio entre a vida cotidiana, do trabalho, dos estudos, e um bem-estar
psicológico”, afirma.
Já
o sociólogo Carlos Magalhães comenta que, mais do que uma forma de lazer, as
atividades que envolvam arte e cultura são itens indispensáveis para a
construção da identidade dos jovens, ainda mais em uma sociedade desigual,
injusta e preconceituosa. Carlos salienta que os jovens necessitam de acessos
mais fáceis a todos os tipos de expressão cultural e artística, até mesmo para
a criação de suas personalidades. “O acesso a esses meios deveria ser
facilitado de modo que os jovens pobres pudessem encontrar seu lugar no mundo
de hoje, além das fronteiras simbólicas e materiais que estão colocadas”, explica.
Propostas oficiais
Belo
Horizonte foi a primeira cidade brasileira a criar um Conselho Municipal da
Juventude, decretado por lei em 1998 (lei 7551/98). O Conselho determina a
finalidade de estudar, elaborar, discutir, aprovar e propor políticas públicas
que permitam e garantam a integração e a participação do jovem na sociedade. Já
a Coordenadoria Municipal da Juventude, por sua vez, visa promover a interlocução,
o acompanhamento e a proposição de ações e políticas voltadas aos jovens
belo-horizontinos. Após um período de inatividade, desde 2005, ambos voltaram a
trabalhar neste ano, e juntos desenvolvem várias ações específicas voltadas ao
público jovem.
O
gerente da Coordenadoria da Juventude, Gelson Antônio Leite, informou ao Lince
as propostas e projetos que a Prefeitura de Belo Horizonte oferece aos jovens
da capital. Entre as novidades, se destaca o “Centro de Referência da
Juventude”, que será um equipamento destinado aos jovens e terá sua inauguração
prevista em maio de 2014. O Centro, que pretende atender de 500 a 800 jovens
por dia, ainda constrói a proposta de projetos, mas proporcionará aos belo-horizontinos
cursos profissionalizantes e ofertas de emprego, teatro de arena, estúdio de
gravação musical, e até uma biblioteca digital e interativa.
Para
as regiões carentes são idealizados os chamados “Fóruns Juvenis”, onde serão
escolhidos locais de maior vulnerabilidade juvenil. A ação será realizada aos
sábados, e levará aos jovens carentes as informações sobre o que a Prefeitura
propõe. Um novo projeto também será inaugurado neste semestre, no Barreiro. O
espaço revitalizado e reformado da antiga FEBEM se torna hoje o “Point
Barreiro”, onde será realizada a “Estação Juventude”, local de atendimento e
execução de oficinas, atendimentos aos jovens, e cadastramento aos programas da
prefeitura. “Pretendemos expandir o “Estação Juventude” para todas as
regionais”, completou Gelson. A respeito da falta de interatividade dos jovens
nos programas ligados a Prefeitura, Gelson acredita que o acesso à informação e
o descredito político podem interferir no interesse dos menores cidadãos.
Grêmio Mineiro
O
clube de futebol Grêmio Mineiro, no Santo André, é presidido pelo ex-policial
civil Wallace da Silva Araújo, e o aposentado Renato Adelino de Almeida. O clube,
fundando em 1947, sobrevive graças ao esforço da comunidade. Da doação de bolas
e equipamentos a uma máquina de lavar roupas e sofás para a sede, todo o
projeto é movido pelo empenho dos presidentes e pela força da sociedade. Apenas
para a manutenção de água e luz é cobrada uma taxa de R$ 60/hora para o aluguel
do campo da agremiação.
Entre
as atividades realizadas pelo clube, a escolinha de futebol é a principal, mas
Wallace destaca que, na maioria das vezes, falta interesse das crianças. Reeleito
para a presidência, desde 2010, ele e o amigo Renato afirmam que, muitas vezes,
fazem papel de assistente social para os jovens mais agressivos ou
necessitados. O motivo principal da escolinha é controlar os problemas que atingem
os jovens da comunidade — a violência e o envolvimento com drogas.“O problema
de falta de lazer é relativo, falta interesse”, afirma Wallace.
O
presidente, às vezes, abre mão do aluguel da quadra, promove lanches comunitários
e, ainda assim, não atrai a atenção dos jovens do Santo André. Em relação aos
pais, Wallace observa que é pouca a presença de estímulo vindo dos mesmos, já
que em reuniões propostas pelos presidentes do clube, apenas alguns se
apresentam e têm consciência da vida ativa de seus filhos. “É preocupante, mas
fazemos tudo o que podemos fazer”, lamenta.
Atleta Cidadão
O
projeto renomeado “Atleta Cidadão” funciona desde 2005 e é administrado por
José Santana, diretor de esportes e formação de atletas do clube Vila Nova, e
atende jovens entre 11 e 16 anos de idade. Os treinos são de segunda a quinta,
sendo terça e quinta para os mais novos, e segunda e quarta para os maiores.
Mesmo sendo novo, o clube já participou de torneios como a “Taça BH”, “Copa
Criança Esperança”, entre outras competições.
Os
treinos, que são realizados em um campo colado ao Cemitério da Paz, são ainda
esperança aos jovens que o frequentam, já que levaram Rafael Vítor, de 20 anos,
para a categoria de base do Atlético-MG — hoje, ele é um dos destaques do
Tupi-MG. Para participar do projeto basta contribuir com R$ 10 para a compra de
bolas e redes. Mas, é imprescindível que o jovem seja frequente e tenha bom aproveitamento
escolar. É bom ficar sabendo que os dados são passados diretamente das escolas
ao treinador Santana — “a melhor herança para uma criança é a educação”,
emociona-se.
O consumo e o lazer
As
alternativas no Shopping Del Rey giram em torno de R$ 79 a R$ 90. Para os
carentes, as opções, às vezes, são quase inacessíveis. Felipe dos Santos
Fernandes, 18, estudante e morador do Caiçara, admite que a melhor escolha é a
quadra de futebol, na Praça da Rosinha, na rua Rosinha Sigaud. Felipe, que vai
diariamente se encontrar e jogar pelada com os amigos, diz que é grande o
movimento de crianças e adolescentes, principalmente à noite. Lanchar com a
turma na praça de alimentação do Del Rey também é uma opção, se sobra alguma
grana — é que os lanches podem variar de R$ 15 a R$ 25!
Fernando
Medeiros, psicólogo, confirma a falta de opções de lazer para o filho de 12
anos. Por isso, a opção é sair da rotina. “Levo meu filho e os amigos na Serra
do Cipó, para andar de bicicleta e também jogar bola na pracinha”. Já para os
menores João André Alves Santos, Gabriel Rabelo Couto e Emerson Lima,
estudantes do 5º ano da escola Dimensão, é unanime a escolha pelas reuniões em
casa dos amigos, onde costumam estudar, jogar futebol ou vídeo game.
Joseanne
Santos e a amiga Priscila Gonçalves, 16, moradoras do Santo André, optam por um
cinema, ou até mesmo se reunir com amigos em casa. Para elas, as garotas da
região sofrem ainda mais que os meninos. “São poucas as opções; às vezes,
decidimos ir a um shopping diferente, mas o Del Rey costuma ser o de mais
frequência”, disse Joseanne, que costuma fazer um “cinema em casa” quando está
sem dinheiro. O preço do cinema na região noroeste varia de R$ 9 a R$ 24, dependendo
dos dias da semana, horários, e salas 3D.
Marcos
Vinicius de Freitas Silva, de 13 anos, e Cleber Eduardo Meirelles, 14, alunos
do 7º ano, moram na Nova Esperança e participam do projeto Atleta Cidadão. Eles
fazem do futebol seu passatempo principal. Além do futebol, costumam ir algumas
vezes ao inevitável Shopping Del Rey quando o parque de diversões Play City
passa uma temporada por lá. Outra opção é o Boliche. Mas, aí, só quando recebem
mesada dos pais. O Boliche se diferencia pelos dias da semana e horário, mas
fica em torno de R$ 48,60 a R$79,20/hora. O bom é que dá pra fazer uma
vaquinha: a pista pode ser dividida em até seis jogadores.
Fotos: Rafael Martins
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